Todo mundo, algum dia, já sonhou fazer parte da realeza. Os palácios, a sofisticação, a riqueza, a elegância, as mordomias, sem esquecer, é claro, do compromisso com a nação. Mas poucas pessoas realmente têm a sorte de nascer em berço real e, ao contrário do que muitos pensam, não é só pelo luxo que existe a monarquia.
Essa forma de governo é uma das mais antigas da história. E existem duas vertentes.
A absolutista e a parlamentarista. Na monarquia absolutista, o rei ou a rainha exercem poder absoluto sobre o país. Diferentemente da anterior, a parlamentarista, embora o monarca seja o chefe de Estado, o poder está nas mãos do primeiro ministro, ou seja, ele é o chefe de governo.
Atualmente, por causa do poder exercido pelos Estados Unidos, é comum pensar que só a forma republicana é moderna e progressista. Entretanto, essa verdade não é absoluta, já que países desenvolvidos, como Holanda, Suécia, Japão, além do Reino Unido - formado pela Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte - são monarquias.
Embora na maior parte dos países monarquistas o sistema vigente seja o parlamentarista, existem outras formas que funcionam atualmente. Na Arábia Saudita e no Qatar, a forma de poder é absolutista.
Já o Vaticano, por exemplo, é a única monarquia eletiva do mundo. Lá, o poder do Papa não é hereditário, já que a escolha de quem vai comandar a Igreja é feita por meio da votação do Colégio dos Cardeais. O que não o torna menos “poderoso” que os demais monarcas, muito pelo contrário. De acordo com a revista “Foturne”, publicada em março deste ano, o Papa Francisco foi apontado como líder mais influente do mundo.
O poder papal está presente na sociedade há muito tempo. Durante a Idade Média, conhecida como a “Idade das Trevas”, o clero exercia enorme poder sobre os devotos - como a venda de indulgências. A ideia pregada à época era de que o Papa era o detentor do poder de aplicar algum castigo para os seguidores da Igreja.
Assim como na Idade Média, o Papa João Paulo II também exerceu forte influência sobre o mundo. Utilizando “armas” como diplomacia, espionagem, encontros secretos com líderes de outras religiões, e, principalmente, a fé, ele ajudou a combater o comunismo implantado no Leste Europeu - o primeiro governo a desmoronar foi na Polônia. O então ditador polonês, general Wojciech Jaruzelski, atribuiu a culpa da queda do comunismo à Igreja. Por esse motivo, o líder da Igreja católica passou a ser admirado por todos.
Inglaterra
A história do Reino Unido é uma das mais ricas que se tem notícia. Mesmo depois de séculos, um dos fragmentos mais importantes permanece intacto. Não com o mesmo poder, mas com a mesma pompa: a monarquia britânica.
A formação desse tipo de governo, como é conhecido hoje, teve início em 1215, com a Magna Carta, assinada pelo rei João. O documento tinha como objetivo limitar a autoridade do rei da Inglaterra. Por exemplo, o monarca só teria autorização para aumentar os impostos após ouvir o Grande Conselho (formado por bispos, condes e barões).
No século XVII ocorreram duas revoluções que, consideradas em conjunto, transformaram a monarquia inglesa de absolutista em monarquia constitucional parlamentarista.
A primeira foi a de 1642, quando, sob liderança do puritano Oliver Cromwell, a pequena burguesia, setores populares, nobres puritanos e parcela nobre anglicanos depuseram o rei absolutista Carlos I e o executaram sob a acusação de traição e despotismo. De 1649 até 1660 a Inglaterra viveu sob o regime republicano, governada primeiramente pelo parlamento e depois, no protetorado, por Oliver Cromwell e pelo filho Richard Cromwell.
Essa primeira revolução anti-absolutista se esgotou em 1660, quando o parlamento restaurou a monarquia e chamou Carlos II para governar a Inglaterra. Ele governou até 1685, quando morreu e foi sucedido pelo filho, Jaime II. Já este último ficou apenas 3 anos no trono, pois ao tentar reimplantar o absolutismo e favorecer a religião católica, foi retirado do trono e no lugar de Jaime II, o parlamento colocou o príncipe holandês Guilherme de Orange e Nassau, casado com uma princesa inglesa da família de Jaime II de Stuart, o rei deposto.
Essa mudança dinástica, uma espécie de golpe de estado sem violências, aconteceu no ano de 1688, e ficou conhecida na Inglaterra e no mundo, como Revolução Gloriosa, ou “Revolução sem sangue”. Com esta segunda revolução de caráter liberal aboliu-se finalmente o absolutismo e fundou-se a monarquia constitucional parlamentarista, que vige até hoje na Inglaterra.
Atualmente, a realeza britânica não tem mais plenos poderes para criar novas leis e cobrar novos impostos. O poder político fica nas mãos do primeiro ministro, que é um representante popular no Parlamento. A rainha Elizabeth II tem apenas o papel de representação do Estado, que é um poder “figurado”. Ela exerce função importante na união do país, em que determinadas circunstâncias podem ser cruciais para ajudar a encaminhar os problemas e impasses, mas não exerce o poder na vida cotidiana.
Para o professor-doutor Sezinando Menezes de história, o monarca inglês perdeu a essência nobre. “A lei que era feita para nobreza, não era a mesma do povo. Mas isso não existe mais. O nobre inglês obedece à mesma lei que o povo. Embora tenha perdido essa essência, ele [o rei] conseguiu manter o status, a posição e o título”, diz o professor.
Pesquisa feita em 2011 pelo jornal “The Guardian” apontou que 67% dos britânicos dizem acreditar que o poder monárquico, além de ser relevante para a vida nacional, é melhor que a república. Essa pesquisa também mostrou que os ingleses afirmam que a família real impõe respeito não só na Inglaterra, mas no mundo.
Para o professor-doutor em história José Flávio Pereira, os ingleses aceitam a monarquia não só pelo governo se confundir com as tradições e a história inglesa, mas também porque o poder real se reciclou ao longo desses anos. “A monarquia deixou de lado a prepotência absolutista e se submeteu às leis que governam a Inglaterra.”
Brasil
Imagine um Brasil diferente do que conhecemos hoje. Em vez de presidente, reis e rainhas; no lugar do Palácio do Planalto, um castelo; em vez de Brasília, o Rio de Janeiro. Parece uma realidade bem distante, não é mesmo? Mas o Brasil foi assim durante a monarquia.
Em 1821, D. João VI precisou voltar a Portugal, deixando o filho, D. Pedro I (D. Pedro IV em Portugal), como príncipe regente. Antes de ir embora, ele limpou os cofres públicos, deixando o Brasil na miséria. Foi nesse cenário que, em 1882, D. Pedro I declarou a Independência. Na obra “1822”, o jornalista Laurentino Gomes relata que o País só deu certo devido à sorte, o acaso e à sabedoria dos homens que decidiam pela nação.
A monarquia brasileira, com o poder que exercia, foi capaz de contribuir de forma decisiva para algumas questões fundamentais da história do Brasil, uma delas foi que, desde o início, a tradição liberal democrática esteve presente na cultura. O poder era dividido em quatro setores, Executivo, Legislativo, Judiciário e o Moderador - o poder do monarca de interferir nos momentos graves, seja dissolvendo a Câmara dos deputados ou convocando uma nova eleição para formar um novo parlamento. Embora D. Pedro I tivesse poder, era limitado. O monarca não podia declarar guerra e nem decretar novos impostos, tudo tinha que passar pelo parlamento.
Além disso, o professor-doutor em história Lupércio Antônio Pereira, disse que a união do Estado não era econômica, mas foi construída politicamente. “Não é como duas ou três capitanias que têm identidade, uma interdependência econômica e social. A nossa economia era mais voltada para a Europa. Cada capitania exportava e importava da Europa. A monarquia teve papel fundamental na unificação do País de mantê-lo coeso. Foi uma construção política, através da Constituição e da ação, sobretudo de Dom Pedro I, que soube conduzir as coisas nessa direção”, contou.
Em 1889 foi instaurada a República. A abolição da escravidão e algumas mudanças econômicas e sociais foram os principais fatores que levaram à queda do Império no Brasil. Embora não pareça algo presente na realidade dos dias de hoje, é possível encontrar grupos que desejam a volta da monarquia.
Em abril de 1993, os brasileiros foram pela segunda vez - a primeira foi em 1963 - às urnas para decidir qual seria o sistema de governo do País. A população deveria escolher entre o regime republicano ou o monárquico. Durante esse período, os candidatos divulgavam as ideias para a população.
O professor Lupércio Antônio Pereira diz acreditar que o poder da monarquia não é um sistema de governo ultrapassado. “Se o Brasil tivesse um monarca como tivemos Dom Pedro I, as grandes agitações políticas e as rupturas institucionais poderiam ter sido evitadas. Haveria a figura do rei que poderia arbitrar determinados conflitos, que não levaria a sociedade a um enfrentamento político militar como foi a revolução de 30 [movimento armado que depôs o então presidente Washington Luís, e impediu que Júlio Prestes assumisse o governo, para por Getúlio Vargas no poder] ou o AI5 [Ato Institucional número cinco, decretado em 1968. Com esse documento o Congresso foi fechado e foram cassados os direitos políticos de várias pessoas]. Por exemplo, depois que a Inglaterra consolidou a monarquia parlamentarista, não teve mais nenhuma revolução. O país conseguiu conciliar progresso com certa estabilidade política, tendo a monarquia como fiadora do funcionamento das instituições.”
Em entrevista publicada no site “Guia dos curiosos”, em setembro de 2013, o jornalista e autor dos livros “1808”, “1822” e “1889”, Laurentino Gomes, relatou que, se o Brasil ainda fosse regido pela monarquia, o poder do País sobre as outras nações poderia ser maior. “O império tinha uma visão estratégica bastante ambiciosa a respeito da posição do Brasil no mundo. Até as vésperas da Proclamação da República, a Marinha brasileira era uma das mais bem equipadas, treinadas e respeitadas do hemisfério ocidental. Infelizmente, parte dessa visão se perdeu ao longo da história republicana. O Brasil se resignou a um papel menor no mundo”, diz Gomes.
Diferentemente da opinião do jornalista, o professor Sezinando Menezes afirma que a forma de governo do Estado não determina o poder que o País exerce sobre os demais. “Isso é oriundo de outras questões: poder militar, poder econômico e poder de impor pressões.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário